Além de promover o desenvolvimento de soluções tecnológicas, a
regulamentação da internet das coisas precisa garantir a privacidade e a
segurança dos usuários da rede. A opinião é do professor e pesquisador
Eduardo Magrani, do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getulio
Vargas - FGV - Direito Rio.
A consulta pública sobre o Plano Nacional de Internet das Coisas (IoT) terminou à meia-noite de ontem (6).
Magrani
explica que internet das coisas é um tema “guarda-chuva” que trata de
objetos inteligentes interconectados, que vão desde carros automatizados
até relógios inteligentes ou eletrodomésticos controlados via celular.
Lembra que tudo isso gera muitos dados sobre os hábitos dos usuários.
“Inclusive
dados sensíveis, eles podem saber o que a gente come, quanto a gente
gasta de calorias durante o dia e qual é o nosso percurso para o
trabalho ou para qualquer lugar. Todos esses dados são informações
pessoais que, se comercializadas ou transferidas a terceiros sem o nosso
consentimento, podem vir a gerar algum dano nas nossas vidas. Então, a
internet das coisas acaba impactando a todos nós por remeter a questões
de privacidade”.
Magrani questiona a falta de transparência no
uso das informações, segundo ele, um dos principais pontos a serem
resolvidos no Plano Nacional. “Você sabe para onde vão esses dados? Sabe
para quem o Google transfere? Você sabe se ele transfere para o seu
seguro de saúde cobrar mais caro? A gente não sabe, então, tem que haver
mais transparência nessas coisas”.
Além de questões de
privacidade, o pesquisador destaca também problemas de segurança que
objetos conectados podem gerar. “A gente já tem exemplo de rackeamento
de carros automatizados, de câmeras de vigilância, o que fez cair o
Netflix e o Pay Pal em dezembro do ano passado. Todos esses exemplos
remetem a falhas de segurança em internet das coisas”, observa.
Padrão tecnológico
Outra
questão a ser tratada na regulamentação, de acordo com Magrani, é o
padrão tecnológico. “Para o seu celular se comunicar com a sua
geladeira, deve haver um padrão compatível de conexão entre eles. Então,
esse é um problema na internet das coisas, como a gente criar padrões
que permitam essa intercomunicação entre os objetos. Essa é uma questão
altamente técnica que está presente na consulta”.
Há a
preocupação, ainda, com mudanças no mercado de trabalho que a internet
das coisas envolve.“A gente precisa, nas escolas, universidades e cursos
técnicos, preparar, capacitando esses alunos para um novo mercado do
século 21, da chamada quarta revolução industrial. Hoje, já há a
expectativa de que várias profissões vão desaparecer do mercado em
função da automação. Escritórios de advocacia hoje estão demitindo
advogados recém-formados e substituindo por softwares, por
robôs, que fazem um trabalho parecido. Então, como a gente capacita
essas pessoas para esse novo mercado que é altamente impactado pela
tecnologia?”, pergunta o professor.
Consulta Pública
Segundo
o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTIC), que desenvolve o
plano em parceria com o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES), a consulta pública sobre o Plano Nacional de Internet
das Coisas (IoT) recebeu mais de 22 mil acessos, que geraram quase 2 mil
contribuições por meio da plataforma Participa.br.
A
consulta começou em meados de dezembro e o prazo inicial para o envio
de contribuições era 16 de janeiro, mas, segundo o ministério, houve
pedido de diversos setores interessados em participar e que não
conseguiram mandar as contribuições a tempo, por causa das festas de fim
de ano, assim, o prazo foi prorrogado.
De acordo com o
pesquisador da FGV, especialistas na área contribuíram bastante para
essa consulta pública, mas faltou engajamento maior da sociedade, com a
participação de cidadãos “entendendo do que trata a internet das coisas e
contribuindo com seu ponto de vista”.
“Essa é a principal função
de uma consulta pública pela internet, que o cidadão possa colocar a
sua opinião. A gente viu muita participação de grupos específicos da
sociedade civil e de empresas e pouco de cidadão individual. Isso
significa que o Estado não fez um bom trabalho para capacitar as pessoas
nesse tema, as pessoas continuam não conhecendo sobre os impactos da
internet das coisas, achando que não têm nada a contribuir. E, na
verdade, a internet das coisas trata de coisas que eles usam
diariamente”.
Debate é prejudicado
Magrani
também critica o fato de a consulta ter sido aberta no período das
festas de fim de ano, o que, para ele, prejudica o debate. “O Estado tem
o dever de capacitar as pessoas para o debate. Foram dois meses, mas
começou em meados de dezembro, quase natal, e iam fechar no início de
janeiro, em meio a datas festivas e ainda voltando de férias. Com que
intuito o Estado quis colocar essa consulta pública na calada da noite?
Afastar as pessoas do debate? A ideia é incluir as pessoas. É um
equívoco colocar uma consulta pública entre natal e réveillon”, disse
ele.
O MCTIC informou que o próximo passo é “consolidar as
informações coletadas na Consulta Pública e juntá-las às demais
informações produzidas pelo Estudo de IoT, realizado pelo consórcio
contratado pelo BNDES que trabalha para a Cooperação Técnica entre o
BNDES e o MCTIC para gerar o diagnóstico e propor ações para o
desenvolvimento da utilização e da geração de valor que a Internet das
Coisas pode gerar para o país”.
Fonte: Agência Brasil
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