Com desemprego em alta, especialistas apontam quais os cuidados de quem precisa acertar as contas
A secretária Ana Cristina Ribeiro ficou desempregada e precisou
recorrer ao cheque especial para quitar suas contas. De volta ao mercado
de trabalho, ela pretende parcelar o que deve, só que seu banco, o
Santander, soma a dívida com valores a vencer do cartão de crédito, o
que aumenta o montante e extrapola seu orçamento. O caso de Ana Cristina
não é o único, no momento em que o Brasil vive o segundo ano seguido de
recessão e 11 milhões estão na fila do desemprego. Neste momento de
crise, órgãos de defesa do consumidor alertam que há direitos a se
defender nas renegociações de dívidas.
— Meu cartão vem sendo pago regularmente, não faz sentido fazerem
isso. O banco deveria considerar a minha renda atual e que eu quero
muito pagar. Estou com o nome sujo por causa disso, algo que nunca tinha
acontecido. E o pior: a dívida está virando uma bola de neve.
A
economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione
Amorim, afirma que, por não haver regulamentação que trate do assunto,
as políticas de renegociação da maioria dos bancos são abusivas. Por
isso, alerta para que o consumidor só entre em um refinanciamento se ele
tiver condições de quitar as parcelas. No caso de cobranças
arbitrárias, o cliente deve denunciar aos órgãos de defesa do consumidor
e procurar a Justiça para que o contrato seja revisto.
— Na
situação citada, como na maioria, observamos abusividade. Os bancos
estão impondo regras sem levar em consideração as rendas dos clientes e
os valores que já foram pagos. Eles incluem dívidas que estão sendo
quitadas e ainda induzem as pessoas que estão em dia, mas com
dificuldades em fazer o pagamento, a atrasar e pagar mais juros, pois as
instituições só fazem a renegociação em caso de alguma inadimplência —
pondera.
Procurado, o Santander informou que está em contato com a cliente para avaliar a melhor opção para solucionar o caso.
Marcelo
Monteiro, especialista em mercado de recuperação de créditos e diretor
de Novos Negócios da PH3A, diz que, ao renegociar, seja com banco, loja
ou prestador de serviço, o mais importante é analisar os aspectos
financeiros da dívida: se o valor está correto, se os juros aplicados
são os contratados, se as condições propostas são justas e se cabem no
bolso do devedor.
Vice-presidente da Associação Nacional dos
Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel
Ribeiro é enfático. O consumidor só deve fechar o acordo se as condições
atenderem às suas necessidades:
— Se verificar que a prestação
vai ficar acima de sua capacidade de pagamento, ele tem o direito de
recusar e apresentar uma contraproposta. Não é obrigado a aceitar logo a
proposta apresentada pelo credor. Trata-se de um acordo mútuo. Só deve
aceitar se entender que a negociação foi justa e que vai conseguir
cumprir com o que foi proposto.
Ribeiro afirma que, diante do
atual cenário econômico, as instituições financeiras e lojas preferem
perder um pouco, dar um desconto, para ter a certeza de receber parte
daquele dinheiro. E o consumidor tem direito de dizer do que precisa
para que a dívida não continue crescendo.
NOVA DÍVIDA, NOVO CONTRATO
Uma
renegociação pode ser entendida como um novo contrato, que deixe claro,
para ambas as partes, obrigações e direitos. Segundo Monteiro, o melhor
é que o processo seja bem documentado e que todas as condições sejam
plenamente compreendidas e aceitas:
— Isso protege ambos os lados
em caso de um questionamento na Justiça. Em uma negociação com os
bancos, não é diferente. Mas, pela natureza financeira, e pela
complexidade dos cálculos de juros, taxas e correção, é prudente
compreender e esclarecer qualquer dúvida, para que o consumidor não se
sinta lesado.
A recepcionista Edivania Alves mudou de emprego e
seu salário caiu à metade. Até reequilibrar seu orçamento, optou por um
empréstimo de R$ 1.400 no Itaú. Ela já tinha uma dívida no cartão de
crédito de R$ 600, cuja parcelas ainda iriam vencer. A recepcionista
atrasou uma das prestações do cartão e renegociou o total da dívida. Ela
diz que, ao fazer o refinanciamento, viu o empréstimo, então em cerca
de R$ 2 mil, pular para mais de R$ 10 mil:
— Já paguei bem mais do
que peguei. Quero quitar as parcelas que faltam, o problema é que
querem que eu pague mais 40 parcelas de R$ 250.
O Itaú disse ter
tentado diversos contatos com a cliente, sem êxito, e informa que já
ofereceu outra proposta de renegociação da dívida, e aguarda retorno da
cliente para fechar o acordo.
Presidente do Instituto Brasileiro de Política e
Direito do Consumidor (Brasilcon), Amanda Flávio de Oliveira diz que,
estando os consumidores de boa-fé e dispostos a renegociar as dívidas, a
criação de obstáculos que dificultem a repactuação não pode prevalecer.
Quando
o consumidor está inadimplente e o credor o inscreve em algum cadastro
de restrição ao crédito, como SPC ou Serasa, basta pagar a dívida para
que o nome seja excluído, obrigatoriamente, do cadastro em cinco dias,
esclarece o promotor de Justiça Sidney Rosa da Silva Junior:
— O
melhor é pagar ou parcelar o débito. Embora alguns prestadores desse
tipo de serviço sejam sérios, já vimos falsos intermediários. Os
cadastros de inadimplentes não podem se recusar a prestar as informações
ao consumidor ou cobrar qualquer quantia para isso, devendo, inclusive,
informar a fonte da inadimplência.
O CAMINHO DA NEGOCIAÇÃO
CRÉDITO:
Verifique as condições do crédito: juros, multas, no caso de atraso, e
formas pelas quais o credor poderá cobrá-lo em caso de inadimplência
EXCLUSÃO AUTOMÁTICA:
O nome do consumidor deve ser excluído dos cadastros de inadimplentes,
no máximo em cinco dias, após o pagamento da conta ou renegociação da
dívida. Não há ônus para consumidor. Não é necessário contratar empresas
para fazer esse serviço de limpeza do nome
PAGAMENTO ANTECIPADO:
Ao renegociar a dívida e antecipar algum pagamento, os juros futuros
embutidos devem ser descontados. Órgãos de defesa do consumidor podem
fazer o cálculo desse desconto
NEGOCIAÇÃO: O
consumidor deve procurar o credor diretamente para negociar a dívida. Se
for apresentada uma proposta, o consumidor não precisa aceitá-la na
hora. Pode oferecer uma contraproposta.
Fonte: O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário