O cenário da distribuição de energia no Brasil vem sofrendo uma
revolução silenciosa. Uma das faces que provocam essas mudanças é a
produção energética pelo próprio consumidor. Desde que a Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel) modernizou a Resolução 482/2012 –
que regulamenta o setor – e flexibilizou algumas normas, o número desse
tipo de ligação às redes de distribuição cresceu consideravelmente: em
dezembro de 2015 eram 1.731 conexões. O número passou para quase 10,5
mil em maio de 2017.
Para o presidente da Associação Brasileira
dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiap), Mário Menel, esse
crescimento logo vai se destacar na matriz elétrica, e, por essa razão, é
necessário um debate desde agora, para que haja tempo de desenvolver um
planejamento para as mudanças que estão por vir. Ele acredita, por
exemplo, que o monopólio de comercialização de energia pelas empresas de
distribuição deixará de existir. “A evolução tecnológica vai levar para
que a gente tenha uma separação. A parte de comercialização fica com
uma determinada empresa, ou várias empresas, e a parte de fio, para você
não ter dois postes concorrendo, vai continuar com um monopólio”,
explica.
Para
o diretor do Departamento de Desenvolvimento Energético do Ministério
de Minas e Energias, Carlos Alexandre Pires, é necessário associar o
estímulo para geração distribuída a mecanismos legais que garantam a
manutenção do sistema de distribuição, inclusive para que a
complementação da energia gerada pelo consumidor chegue até ele. “Isso
está acontecendo em todos os lugares do mundo, onde a energia eólica e a
solar estão ganhando importância, porque ao extremo você não teria
distribuidora de energia.”
Mário Menel explica que em países como
Portugal esse modelo que separa distribuição e comercialização de
eletricidade já é uma realidade. “Mesmo que você não queira colocar
energia no seu telhado, você escolhe o seu fornecedor de energia. E esse
fornecedor, que é uma empresa com expertise em colocar, olha para o seu
caso e diz: eu vou botar o painel em cima do teu telhado e você vai
comprar energia de mim, mas essa energia é minha”, projeta. Para ele, o
caminho é inevitável. “São arranjos comerciais que vão surgindo em
função do avanço tecnológico, que não tem como você ser contra”, afirma.
No
Brasil, grandes consumidores como redes de hotelaria e indústrias já
escolhem seus fornecedores de eletricidade. O presidente da Abiap
explica que em cerca de cinco anos esse modelo chegará ao consumidor
residencial. Para que a transição entre os modelos ocorra de forma
tranquila, ele explica, que é necessário haver planejamento desde agora.
“Não podemos esquecer que quem lastreou a expansão do sistema como nós
conhecemos hoje, em contratos de longo prazo, foram as distribuidoras, o
mercado cativo. Agora vão deixar de lastrear, então, o sistema
financeiro vai ter que entrar no setor elétrico e oferecer produtos que
nos deem capacidade para financiar essa expansão.”
Atualmente, o
Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o único
que financia o setor elétrico brasileiro, com linhas de crédito de até
80% para energia fotovoltaica (solar), por exemplo. Devido a projetos de
eficiência energética no Ministério de Minas e Energia e na Aneel,
desde o ano passado, a geração de energia a partir de fontes não
renováveis não está mais entre as opções de financiamento para o setor.
No entanto, para Mário é necessário ir além e atrair outros bancos,
criando um funding, ou seja, uma captação de recursos para investimento,
que poderá ser saudável para o setor. “Naturalmente, isso vai implicar
em custos reais. Pode ter um aumento no começo? Pode. Mas a competição
acaba diminuindo os custos.”
Fonte: Agência Brasil
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