quarta-feira, 9 de setembro de 2015

A face mais feia dos tratamentos de beleza

Queimaduras na pele, perda de cabelo, infecção de cutículas, efeitos inesperados de procedimentos estéticos

Uns pelinhos na barriga incomodavam a arquivista Thabata Ribeiro de Andrade, de 27 anos. Em julho do ano passado, ela entrou na clínica de estética Onodera da Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio, para uma sessão de depilação a laser na linha do abdômen. Saiu de lá com várias queimaduras na pele, incluindo bolhas que deixaram em carne viva a tatuagem que tinha na região. Seguiram-se cinco meses de tratamento, durante os quais ela não pôde fazer exercícios e teve de escolher com cuidado as roupas. A tatuagem precisou ser refeita e depois de tudo ainda sobraram marcas na pele, que ficou meio enrugada.
— Liguei para a clínica, e a funcionária contou que não fui a única a reclamar de queimaduras depois da depilação. Ela explicou que a calibragem da máquina estava errada, o que teria sido verificado pela médica, que fez um teste numa área reduzida. Não entendo por que não cancelaram o tratamento em todas as pacientes — diz
A clínica chegou a pagar por atendimento médico, mas, como o consultório ficava em Copacabana, longe do bairro onde Thabata mora — Jacarepaguá —, ela acabou procurando outro profissional. E abriu um processo na Junta Especial Cível e obteve o direito de receber R$ 5 mil por danos morais. Segundo ela, a empresa depositou 30% do valor em juízo, mas quer parcelar o restante em seis vezes, alegando que não tem dinheiro.
 
‘BIFE’ NA MANICURE SAIU CARO

O caso de Thabata é ilustrativo de traumas ocorridos na busca pela beleza, devido à falta de preparo dos profissionais para realizar os procedimentos e ao uso de produtos inadequados, que acabam nos tribunais. No Rio Grande do Sul, a 10ª Câmara Cível da Comarca de Porto Alegre condenou, recentemente, um salão a pagar R$ 8 mil de indenização por danos materiais e morais à cliente que teve quedas de cabelo depois de fazer um relaxamento.
Mas a situação pode ficar feia até em práticas rotineiras. Ir à manicure toda semana, por exemplo, é um ritual de boa parte das brasileiras, como a empresária Valéria Vilella, que frequentava o salão Werner do Shopping Tijuca.
— Arrancaram um “bife” do meu anelar esquerdo, e o resultado foi uma inflamação. Surgiu carne esponjosa que soltava uma secreção. Não dava para lavar louça, dirigir nem fazer outras atividades do dia a dia — conta. — Fui ao pronto-socorro três vezes. Depois, a uma dermatologista, que fez cinco sessões de cauterização. Mesmo assim, houve uma infiltração e acabei submetida a um procedimento cirúrgico. O médico chegou a alertar sobre a possibilidade de perder um pedaço do dedo — conta ela.
Entre procedimentos, pomadas, antibióticos e anti-inflamatórios, os gastos chegaram a R$ 8 mil, calcula Valéria, que, na época, tentou ser ressarcida pelo dono do salão. Não teve sucesso. A dificuldade para dialogar piorou porque, com a inflamação se agravando, ela decidiu cancelar um pacote de sessões de drenagem linfática no mesmo salão de beleza, pelo qual já havia pago R$ 1.200.
— A própria massagista avisou que eu não deveria me submeter a massagens. Então, sustei os cheques, e eles me acionaram judicialmente.
Diante do imbróglio, a empresária recorreu à Justiça. Submeteu-se a uma perícia médica, ao custo de R$ 4.300. Agora, com custas judiciais e advogado, a conta do “bife” arrancado “já se aproxima de R$ 20 mil”, diz Valéria.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) diz que, para evitar problemas, o consumidor só deve aceitar ser submetido a tratamentos com produtos autorizados por ela. No caso de produtos manipulados pelo próprio salão, é preciso verificar se o estabelecimento tem autorização para realizar o procedimento e, mesmo assim, é preciso checar se as substâncias usadas são autorizadas.
O presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Estética (SBME), Nelson Rosas, explica que procedimentos como aplicações de toxina botulínica, implantes cutâneos, carboxiterapia (injeção de gás carbônico no tecido transcutâneo para melhora de circulação e oxigenação), tratamento a lasers, luz pulsada, radiofrequência, ultrassom e peelings químicos devem ser realizados por um médico habilitado.
— O médico tem de ser dermatologista, cirurgião ou médico clínico com capacitação em tratamentos estéticos e deve ter cadastro no Conselho Regional de Medicina do estado — diz Rosas.
Além disso, explica, as clínicas devem, ainda, estar cadastradas no conselho regional de medicina, no conselho da especialidade médica e também na Anvisa.
Em caso de problemas, o consumidor pode ir ao Procon ou diretamente à Justiça. No órgão de defesa do consumidor, vale o relato, e cabe ao fabricante do produto a responsabilidade de provar que a substância não causou o problema. Na Justiça, é possível provar o dano com uma perícia, como a usada por Valéria. Já os Juizados Especiais Cíveis não adotam as perícias.
O QUE DIZEM AS EMPRESAS
A Onodera diz que “prestou todo o suporte à cliente desde a sua ocorrência, oferecendo atendimento médico especializado, a devolução integral do valor pago pelo tratamento e o reembolso de todas as despesas médicas geradas”. Thabata, porém, afirma que os remédios ficaram por sua conta, bem como o custo da correção da tatuagem danificada. A clínica também afirma que a unidade Barra e a médica responsável “atuam de acordo com os mais criteriosos padrões exigidos pela franqueadora e pelos órgãos competentes”. A empresa, porém, não explicou as razções das queimaduras sofridas pela cliente.
O Werner diz que é a primeira vez na história da rede que se registra um problema como o vivido por Valéria e acrescenta: “Lamentamos o ocorrido e informamos que o caso está sendo tratado com toda a atenção, diretamente entre a cliente e os franqueados da unidade, aguardando o julgamento e decisão judicial”.
NÃO SE ARRISQUE
Produtos: Para verificar se um produto está autorizado pela Anvisa, vá ao site da agência (portal.anvisa.gov.br). No menu Proteção à Saúde, clique em Produtos para saúde. Depois, no menu Acesso fácil, selecione Consulta a Produtos/Empresas. Então, clique em Consulta a Bancos de Dados e escolha Produtos Para Saúde. Enfim, ao eleger Pesquisa de Produtos para Saúde Registrados, você chega aos campos de consulta
Profissionais de estética: Esteticistas e fisioterapeutas estéticos podem fazer drenagem linfática, massagem modeladora, limpeza de pele, estimulação muscular passiva e peelings físicos superficiais (cristal, diamante), informa a Sociedade Brasileira de Medicina Estética (SBME)
Médicos: Aplicações de toxina botulínica, implantes cutâneos, carboxiterapia (injeção de gás carbônico no tecido transcutâneo para melhora de circulação e oxigenação), lasers, luz pulsada, radiofrequência, ultrassom e peelings químicos, superficiais ou profundos, são reservados a médicos com especialização em estética. Eles têm de estar registrados no Conselho Regional de Medicina do estado, diz a SBME
Clínicas e consultórios: Também precisam de registro no Conselho Regional de Medicina do estado e ainda manter licença da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), validada anualmente, conforme a SBME
Fonte: O Globo

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