Comprar em sites chineses que reúnem
diversos varejistas vendendo de eletrônicos a roupas, com frete gratuito
e preços muito abaixo dos praticados no Brasil — tem relógios de pulso
que trocam pulseira por menos de R$ 10, capa para smartphone a R$ 2,70, e
até vestidos de noivas que custam R$ 300 — virou uma febre. Segundo os
Correios, nos últimos quatro anos o volume de encomendas importadas
aumentou 400%, a maior parte vinda dos países asiáticos. Para se ter uma
ideia, entre julho e setembro do ano passado, só a loja virtual chinesa
AliExpress, a mais popular entre os brasileiros, somou 11 milhões de
pedidos, de acordo com o instituto de pesquisa Ibope E-commerce.
A
questão é que a espera pela entrega, que dificilmente é menor do que
dois meses e pode chegar a um ano, segundo relatos de consumidores a
esta seção, tem irritado os clientes. A reclamação normalmente é
dirigida aos Correios, pelo tempo de entrega do produto depois que este
chega ao Brasil. As mercadorias ficam por meses num centro de
distribuição, em Curitiba, antes de serem despachadas aos destinatários.
Durante a espera, a queixa é que não há informações sobre o desembaraço
da mercadoria. Os Correios alegam que a demora ocorre devido ao tempo
necessário para os trâmites de importação. De acordo com a Receita
Federal, só não há taxação para encomendas de até US$ 50 (cerca de R$
143), desde que feitas entre pessoas físicas.Caio Silva Caldara, morador de Brás de Pina, Zona Norte do Rio, fez uma compra no AliExpress no valor de US$ 13, cerca de R$ 35, em outubro do ano passado. Por meio do código de rastreamento, verificou que a encomenda foi recebida pelos Correios no dia 21 do mesmo mês. No entanto, só recebeu o produto três meses depois. Durante todo esse tempo, o status do rastreamento permaneceu inalterado. Ele entrou em contato quatro vezes com os Correios, por site e telefone, mas de nada adiantou:
— Sempre ganhava uma resposta genérica e sem solução. O prazo que foi descumprido. Fica minha indignação com relação ao serviço.
CAUTELA ANTES DAS COMPRAS
Entidades de defesa do consumidor esclarecem que compras em sites do exterior são um processo de importação que tem regras próprias, como a possibilidade de taxação e, dificilmente, terão respaldo das leis de proteção brasileiras. O diretor do Departamento de Proteção ao Consumidor da Secretaria Nacional do Consumidor (DPDC/Senacon), Amaury Oliva, explica que não há consenso a respeito da jurisdição sobre as compras feitas em sites estrangeiros, o que pode dificultar a resolução de problemas pós-venda. Ele orienta os consumidores a priorizarem empresas com escritório ou representantes no Brasil.
— Se o site é chinês e não tem representante no Brasil, de quem o consumidor vai cobrar? Ele tem direitos, mas terá dificuldades de exigi-los, também por conta da diferença de idioma. É uma situação complexa em discussão no mundo inteiro — reiterou Oliva.
A advogada Cláudia Almeida, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), concorda com ele:
— É uma compra desprotegida das nossas leis. Então, se tiver algum problema, corre-se o risco de ter de acionar a Justiça chinesa, em outra língua . Um contato que será bastante difícil.
A assessora técnica do Procon-SP Fátima Lemos recomenda cautela na hora de comprar de empresas do outro lado do mundo.
— É preciso avaliar o custo-benefício da compra de forma ampla, apesar de o preço ser tentador. Deve-se verificar se o produto pode ser taxado, se o site dispõe de ferramentas de comunicação com os clientes em português, política de troca e devolução e se o frete contempla entrega rastreada — alerta Fátima.
NECESSIDADE DE MAIS TRANSPARÊNCIA
Carlos Alberto Rocha, de Niterói, comprou dez produtos no AliExpress, em agosto do ano passado. Um deles ainda não foi entregue. Ele reclamou aos Correios, que deram o objeto como não localizado e orientaram-no a reclamar ao fornecedor. Mas, por meio do código de rastreamento, ele já havia verificado que a encomenda tinha chegado ao Brasil e estava no serviço postal:
— O produto foi postado, entregue aos Correios, que sumiram com a mercadoria, que é minha. Correios no Brasil são caso de polícia.
A demora para a entrega das três camisas compradas por Fernando José Ayres Carvalho, também no AliExpress, é ainda maior. O morador da Freguesia, em Jacarepaguá, pagou US$ 41,70 pela compra, cerca de R$ 120, em março do ano passado. Quase um ano depois, ainda não recebeu as mercadorias, apesar de terem chegado aos Correios em maio de 2014. Em agosto, reclamou à Ouvidoria do serviço postal, que o orientou a preencher o formulário de reclamação. Desistiu, pois não tinha todos os dados exigidos, como o CNPJ do site chinês:
— A última informação do rastreamento nada tinha a ver com a China, já que a informação era “Recebido pelos Correios”. Um mês depois, as informações sobre o rastreamento não estavam mais disponíveis. Extraviaram minha encomenda em Curitiba, e a Ouvidoria deu cobertura ao fato — queixa-se.
Marcelo Alves dos Santos teve problemas com a entrega de compra feita em outro site chinês, o DX.com — que vende brinquedos, eletrônicos e equipamentos de informática. Os produtos chegaram aos Correios em setembro, mas, até hoje, não foram entregues. “Os chineses têm uma empresa que consegue encaminhar, sem erro, um produto ao Brasil. Aqui, os Correios não conseguem achar minha residência, que fica a 670 quilômetros do centro de distribuição. É lastimável o quanto somos limitados”, escreveu em carta ao GLOBO.
Os Correios explicam que o que os consumidores consideram demora na entrega, trata-se do tempo necessário para que as encomendas passem pelos trâmites do processo de importação. Segundo a companhia, há a “falsa impressão de que a mercadoria ficou parada quando, na verdade, está passando por diversas áreas não exibidas no rastreamento por terem sido contratadas na modalidade frete econômico, conforme definido pelas regras postais mundiais”. Neste caso, o código de rastreamento é iniciado pela letra “R”. Assim, ao digitar o código no site dos Correios para verificar o andamento da entrega, o consumidor terá acesso apenas às datas de envio, chegada ao Brasil e entrega no endereço solicitado, depois de feita. A previsão de entrega é de 60 dias úteis, a partir da fiscalização. Todos os vendedores do AliExpress oferecem mais de uma opção de frete, que pode ser selecionado na hora da compra do produto ou no carrinho. Se o consumidor optar por pagar o frete, a encomenda chegará mais rápido, diz o site.
Para o diretor do DPDC, os Correios têm de prestar informações detalhadas aos consumidores, mesmo que o frete contratado não preveja detalhamento:
— O consumidor tem o direito de exigir transparência dos Correios, pois eles têm participação nessa transação.
Para agilizar este desembaraço, os Correios firmaram, em julho de 2014, parceria com o Grupo Alibaba, que administra o site AliExpress, para melhorar as condições de postagem na China e orientar sobre as informações que devem ser repassadas à aduana, para antecipar o processo de nacionalização da encomenda, antes da chegada do bem ao Brasil..
Fonte: O Globo
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