Nada menos do que 50 minutos. Foi o que teve
de esperar para ser atendida pelo call center da sua operadora
telefônica, a Vivo, a tijucana Carla Sobral, em janeiro. A demora no
atendimento não chega a ser novidade para a consumidora, que já
desenvolveu uma técnica para não perder tempo: ativa o viva-voz do
telefone e aproveita para adiantar o serviço da casa. Mas, não bastasse o
tempo de espera, o pedido feito ao atendente foi apenas parcialmente
atendido. Em vez de cancelar as caixas postais das três linhas de
celulares, como solicitado, ele desabilitou só duas. Temendo passar por
novo calvário, Carla reclamou diretamente a esta seção e à Agência
Nacional de Telecomunicações (Anatel). Só assim conseguiu que o problema
fosse resolvido.
— Ontem (5 de março),
tinha outra questão para resolver com a Vivo. Temendo não conseguir ser
atendida pelo telefone, procurei uma loja em shopping. Mas o atendimento
foi igualmente ruim. Tive de aguardar das 19h38m às 20h15m para ser
chamada pelo atendente — reclama a consumidora.
TRÊS REPROVADOS EM TESTE
O
relato de Carla mostra que o Decreto 6.523, conhecido como Lei do SAC,
implantado em 2008 para qualificar e agilizar a solução de problemas de
consumo por meio dos Serviços de Atendimento ao Consumidor (SACs), ainda
é desrespeitado por empresas, dificultando a resolução amigável de
conflitos e sobrecarregando Procons e Tribunais de Justiça de todo o
país. Entre outras regras, ele determina que o tempo máximo de espera
seja de um minuto, após selecionada a opção no menu eletrônico, para
operadoras de telecomunicações, empresas de transportes terrestre e
aéreo, concessionárias de energia elétrica e operadoras de saúde. Bancos
e administradoras de cartões têm de atender ainda mais rápido, em até
45 segundos.
Na semana em que se comemora o
Dia Mundial do Consumidor, 15 de março, esta seção discute, em uma
série de matérias, avanços, dúvidas e problemas que ainda fazem parte do
cotidiano do brasileiro.
Teste feito pelo
GLOBO com o canal de atendimento de nove companhias regidas pela norma e
que figuraram entre as dez mais demandadas junto aos Procons de todo o
Brasil em 2014, de acordo com boletim da Secretaria Nacional do
Consumidor (Senacon), comprovou o problema. Um terço das nove companhias
testadas descumpriram o prazo: Oi, Vivo e Net. Respectivamente a
primeira, a segunda e a décima empresa mais demandada no ano passado nos
Procons. Atenderam dentro do tempo estabelecido pelo decreto Claro,
Itaú, Bradesco, Sky, TIM e Caixa.
O teste
foi feito na manhã do último dia 2. A Oi levou nove minutos para atender
pelo telefone 1057 e a Vivo, 23 minutos e 38 segundos pelo *8486. No
caso da Net, a repórter desistiu da ligação, feita para o 10621, após 30
minutos de espera sem sequer acessar o menu de opções.
SITUAÇÃO PREOCUPANTE
Amaury
Oliva, diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor
(DPDC) da Senacon, classificou o resultado do teste como “preocupante”.
Em 2009, o DPDC ingressou, em parceria com o Ministério Público Federal e
outros órgãos públicos e entidades de defesa do consumidor, com duas
ações civis públicas coletivas contra as duas empresas mais reclamadas
naquele ano, Claro e Oi, por desrespeito às regras. As ações ainda
tramitam na Justiça do Distrito Federal e pedem que cada empresa pague
R$ 301,35 milhões de indenização por dano moral coletivo. Ao GLOBO, as
duas companhias informaram que não comentam ações judiciais em trâmite.
Ainda segundo Oliva, a Senacon já aplicou R$ 18 milhões em multas por
desrespeito ao decreto.
— O que diferencia
uma empresa da outra é o atendimento. Ao negar ou dificultar esse
primeiro contato, a empresa perde a oportunidade inicial de resolver o
conflito e transfere essa responsabilidade aos Procons e à Justiça, pois
o consumidor tem de recorrer a eles. É importante lembrar que o Estado
não é call center de empresa — destaca o diretor do DPDC.
Ricardo Morishita, diretor do DPDC na época em que o decreto entrou em vigor, também recebeu os resultados com preocupação:
—
Quando se pensa que sem esse contato inicial é difícil solucionar de
forma amigável um problema, isso se torna grave, pois está sendo
retirado um direito básico do consumidor, que é ser ouvido. Essa
gravidade pode ser representada pelo volume de problemas de consumo que
se transformam em ações judiciais. Mais do que ferir o código,
dificultar o contato com o SAC é uma falta de respeito com o consumidor —
diz Morishita, atual diretor de Projetos do Instituto Brasiliense de
Direito Público (IDP).
No ano passado, em
uma fiscalização do cumprimento do Regulamento Geral de Direitos do
Consumidor de Serviços de Telecomunicações, da Anatel, pelas operadoras
de telefonia, o Procon-RJ acabou identificando que clientes de Oi, GVT e
Vivo esperavam mais de 60 segundos para serem atendidos nos SACs. As
três empresas foram alvo de processos administrativos, que ainda
tramitam na autarquia. Se as justificativas apresentadas pelas empresas
não forem aceitas, elas serão multadas.
Sobre
este processo do órgão estadual, a Oi também não quis se pronunciar. Já
a Vivo informou que apresentou defesa e aguarda a decisão do órgão. A
GVT disse estar adequada às normas, mas que o prazo de um minuto de
atendimento pode ser “excepcionalmente afetado por fatores externos e
fora do controle das operadoras”.
#NÃOCONSIGOSERATENDIDO
Cláudia
Almeida, advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
(Idec), orienta o consumidor que não conseguir acessar o SAC que
denuncie à ouvidoria da empresa e ainda registre o problema nas redes
sociais:
— A exposição na internet tem
impacto muito negativo na imagem da empresa. O consumidor deve reclamar
usando a hashtag #nãoconsigoseratendido, que é monitorada pelas
companhias. O problema é que muitas pessoas já estão desacostumadas a
serem bem atendidas. Institucionalizou-se o mau atendimento.
Já
Marta Aur, assessora técnica do Procon-SP, acredita que a falta de
credibilidade de algumas empresas é tamanha a ponto de o consumidor nem
tentar um primeiro contato, recorrendo direto aos Procons ou às redes
sociais, o que não é o caminho ideal. Para Marta, há muito o que avançar
com relação ao pós-venda.
— As empresas
mais reclamadas continuam sem estrutura para atender. Colocam os
serviços e produtos à venda e não se estruturam para receber demandas —
critica.
Para Morishita, boas empresas
atendem dentro do limite de espera estabelecido pelo decreto porque
privilegiam o respeito ao cliente:
— Toda a
vez que se fala em atendimento, se fala em custo que deve ser suportado
pela empresa, porque faz parte do processo de concessão. Elas têm de
ser eficientes. Devem garantir atendimento adequado para o consumidor
ter a sua expectativa atendida. Do contrário, está impedindo o
consumidor de acessar seu direito à efetiva reparação de dano.
Sobre
o teste feito pelo GLOBO, as operadoras Oi e Vivo informaram que as
falhas relatadas são pontuais e foram imediatamente corrigidas. A Oi
disse ainda que segundo medição feita pela própria empresa, o tempo
médio de atendimento é inferior a 20 segundos. Sobre o problema com a
consumidora Carla, a Vivo apenas confirmou que o caso foi solucionado.
Já a Net negou, em nota, que a falha tenha ocorrido: “não verificamos
nenhum problema em nossa Central de Relacionamento nos últimos 30 dias”,
declarou a companhia.
O QUE DIZ O DECRETO
Setores:
As regras valem para empresas de telecomunicações (telefonia, internet e
TV a cabo), transportes terrestre e aéreo, energia, bancos,
administradoras de cartões de crédito e operadoras de saúde.
Atendimento: Deve ser 24horas, sete dias por semana.
Tempo de espera: Após
selecionada a opção do menu, o tempo máximo de espera deve ser de um
minuto, exceto para bancos e administradoras de cartão, que é de 45
segundos.
Menu: O primeiro menu eletrônico e todas as subdivisões devem oferecer a opção “Falar com atendente” .
Transferência:
Se o consumidor ligou para reclamar ou cancelar o serviço, não pode ser
transferido para outro atendente. Nos outros casos, só pode ser
transferido uma vez e o próximo atendente não pode exigir que o problema
seja relatado novamente.
Cancelamento: A opção de cancelamento deve estar no primeiro menu.
Tempo de resposta: É de até cinco dias úteis após a queixa.
Custo da chamada: Nos setores regulamentados, a ligação tem de ser gratuita.
Fonte: O Globo
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