segunda-feira, 4 de março de 2013

Consumo das famílias puxa PIB em 2012, mas sofre aperto com inflação

Desanimadas para gastar em 2013, famílias trocam marcas por economia.
Inflação preocupa consumidor, que tenta manter gastos no mesmo nível.

Um dos responsáveis pelo crescimento da economia em 2012, com expansão de 3,1% na comparação anual, o consumo das famílias passa por um momento de espera diante do aumento de preços sentido no bolso e da incerteza em relação ao crescimento do país.
O casal João e Sidnei Pontes não olha mais a marca e escolhe o produto mais barato para tentar manter os gastos. (Foto: Simone Cunha/G1)A redução do poder de compra da assistente social Vilma Barreto se traduz no que ela conseguia comprar quando era estagiária e hoje, como profissional, não consegue. “Se pudesse optar, teria comprado uma geladeira junto com o notebook que comprei no fim do ano”, diz, a exemplo do que fez quando era estagiária: comprou ao mesmo tempo geladeira e fogão.
“Antes eu não tinha que olhar o preço de tudo, as coisas subiam menos”, diz. Hoje, ela economiza e reclama de ter sempre o mesmo a pagar. Trocou o feijão carioca pelo frade, vai ao supermercado com intervalo maior que um mês para reduzir o gasto com táxi – “que também subiu, de R$ 17 para R$ 23” – e continua vendo os gastos subirem.
O IPCA, considerado a inflação oficial do país, vem subindo nos últimos meses e, em janeiro, chegou a 0,86%, maior alta mensal desde abril de 2005.
Segundo o economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Nicola Tingas, as famílias enfrentam um ajuste de orçamento que começou no segundo semestre do ano passado por conta da alta dos preços, certa perda de controle do orçamento e endividamento em alta. “Estamos vivendo um período de travessia e o cuidado é absoluto, o orçamento está apertado”, diz Tingas, que acredita que o vigor do consumo das famílias deve ser retomado no segundo semestre. Antes disso, há incerteza.
O índice de confiança da Fundação Getúlio Vargas (FGV) – que aponta a satisfação do consumidor com a situação atual e as expectativas para os próximos meses – está em queda há cinco meses. A diminuição da confiança dos consumidores vem sendo influenciada em maior magnitude pela diminuição da satisfação com a situação atual do que das expectativas em relação aos meses seguintes, diz a fundação.
Em épocas de transição é normal que os consumidores se atentem preço a preço às compras nos supermercados, diz Tingas.
Desempregada, este ano Fabiana não pensa em gastar nada além das contas correntes. (Foto: Simone Cunha/G1)Em busca de economia, João Vale Pontes e sua esposa Néia abandonaram a avaliação pela marca e se atêm à etiqueta dos preços. Além disso, tiraram da lista itens que tinham se começado a comprar há pouco tempo, como iogurte e chocolate e passaram a comprar carne de segunda ou colchão mole. “Há muito tempo não comprava chocolate, hoje estamos levando porque estava na promoção”, diz João, no caixa de um hipermercado, em São Paulo.
Desempregada por opção desde outubro e depois de comprar TV, móveis e carro no ano passado, Fabiana da Silva Santos não pretende gastar nada além das contas correntes, em que ainda se esforça para manter o mesmo nível de despesa. Feliz porque o filho começa a deixar as fraldas, o que vai reduzir os gastos com o produto, ela aponta a lista de material escolar que vai ter comprar no lugar.
Sempre que percebe a alta no preço de algo que faz parte de sua lista de compras, ela busca soluções alternativas para manter os gastos. O leite vitaminado que o filho tomava, por exemplo, ela substituiu por leite integral e complemento alimentar.
Inflação
A professora Jacqueline Haffner, que pesquisa as economias emergentes e seus modelos de crescimento na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), aponta que o consumo tem de ser acompanhado de produção para não gerar inflação. “Senão, as camadas inferiores são as que mais vão sentir porque é onde a inflação pesa mais na renda. Se os preços aumentam e se não têm contrapartida salarial, elas reduzem o consumo”, diz.
Na análise da professora Hildete Pereira de Melo Hermes de Araújo, que pesquisa o setor de serviços na Universidade Federal Fluminense (UFF), deve haver aumento da produção em 2013 o que vai fazer a economia reagir e o consumo se manter no mesmo patamar. “O nível de emprego deve se elevar com o aumento da produção e o consumo continuará no mesmo patamar, e como um aspecto importante”, diz.
O professor Marcel Guedes Leite, da PUC-SP, lembra que o crescimento está centrado no consumo há algum tempo. "Inicialmente foi visto como uma maravilha, mas a novidade é que em 2012 o PIB não cresceu como
deveria. Parece que se encontrou um limite de crescer pautado no consumo", diz. O principal problema deste modelo, para ele, é a alta da inflação. "O problema é como sustentar isso e também não há boas expectativas para 2013. Há pressao inflacionária grande e não se
consegue alavancar (o consumo)", afirma.
Futuro do consumo
Por um lado, especialistas apontam que o consumo das famílias pode ter minimizado o impacto da crise internacional na economia do país, já que as exportações e a produção caíram, mas internamente as compras continuaram. Por outro lado, no entanto, a continuidade desse modelo preocupa especialistas – embora nenhum deles veja um cenário futuro parecido com o atual e apostem que o investimento e a produção industrial irão mostrar resultados neste ano.
Para a professora Jacqueline Haffner, da UFRGS, a continuidade da aposta no consumo das famílias pode levar à alta das importações – pelo consumo de importados – e trazer problemas ainda maiores para as famílias caso haja um aumento do desemprego.
A avaliação de Hildete, da UFF, é a de que o consumo das famílias não sustenta o crescimento no médio prazo. “Ele tem fôlego mais curto. Dá um distribuição de renda mais rápida, mas para ser duradoura é preciso estar ancorada no aumento da produtividade, da produção”, diz.
Nicola Tingas, da Acrefi, aponta que, para puxar o PIB neste ano e animar o consumo das famílias é preciso anumar o investimento. Ele também vê essa parada do início do ano como necessária, já que, com as finanças arrumadas, se pode voltar a consumir.
Fonte: G1 - Noticias

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